quarta-feira, 1 de março de 2017

Quanto vale seu artigo Qualis em Engenharias I



Nesse blog, vou tratar do valor relativo de publicações científicas do Qualis, para fins de avaliação dos programas de pós-graduação. Como participei de várias avaliações e elaboração de Qualis de Engenharias I, farei a análise para essa grande área. A principal referência para a análise será o Documento de Área das Engenharias I, 2017 (DOCENG1).

No DOCENG1 há dois critérios que valoram as publicações: o Critério 3, Corpo Discente, Teses e Dissertações, tem peso 35% na avaliação global; o Critério 4, Produção Intelectual, também tem peso 35% no global. As publicações analisadas são os artigos científicos classificados nos estratos Qualis A1, A2, B1, B2, B3, B4, B5, Livros e Capítulos de Livros. O estrato C Qualis significa que se trata de periódico não científico.

O Subcritério 3.1, que tem peso 50% do Critério 3, é avaliado por dois indicadores objetivos, o QTD com peso 70%, e o QTM com peso 30%. Equações a seguir.



No Critério 4, Subcritério 4.1, com peso 50% do Critério 4, há três indicadores: PDQ1 (80%), PDQ2 (10%), e PDQ3 (10%). As equações dos indicadores são:



DP = número de docentes permanentes no Programa, L = Livro, CP= capítulos de livros. 


A Matriz de Valoração Relativa de Publicações (MVRP)

Para permitir uma visão de conjunto, formulamos a Matriz de Valoração Relativa de Publicações (MVRP). A MVRP foi construída com o conceito de Valor Adicionado por Unidade de Publicação. Estimamos, para cada tipo de publicação, qual o valor agregado pela mesma nos indicadores do Documento de Área. Construímos quatro matrizes: uma para o Critério 3, uma para Critério 4, e duas para a avaliação global, uma antes da saturação e outra pós saturação por artigos em anais

Para os critérios 3 e 4, as cinco equações dos indicadores são condensadas em duas equações, uma para cada critério. Para cada equação, colocamos um tipo de publicação e avaliamos quanto essa publicação agrega ao indicador do critério. Daí, construímos duas MVRPs. Para a avaliação global formulamos uma planilha Excel. A dedução da equação única é possível, porém seria muito complexa. 

MVRP do Critério 3  Discentes, Teses e Dissertações

Deve ser observado que no Critério 3, o DOCENG1 não faz referências a valores de saturação. Assim, tem-se a equação do Valor Agregado pela Publicação no Critério 3 (VAPC3), que permite estimar o valor agregado por um tipo de publicação para o referido critério.

Nesse critério, a MVRP é formada pelos coeficientes da equação e por seus inversos.

      MVRP do Critério 3 -  Discentes, Teses e Dissertações  



A matriz pode ser lida da seguinte maneira. Para saber quantos artigos em Anais devemos publicar para valer um artigo A1 no Critério 3, procuramos o cruzamento da coluna Anais com a linha A1 e achamos 2,33. Isto é, para o Critério 3, publicar, em média, 2,33 artigos em anais, equivale a um artigo A1. Para a valoração relativa de  B3 e Anais, encontramos que são necessários 2,14 B3 para valer um artigo em anais. Em outras palavras, um artigo B3 vale menos da metade de um aartigo em anais.

Observe-se que o critério se refere a discentes, assim, as publicações devem ter um discente como um dos autores. Observe também que nesse critério, e também no Critério 4, os artigos B4 e B5 não agregam qualquer valor aos indicadores. Isto é, um periódico B4, ou B5,  é equivalente a um periódico não científico (C).


MVRP do Critério 4 


No Critério 4, o indicador PQD3 é saturado no valor três. Isto é, as publicações em anais. Isto é, só são valoradas até o máximo de 12 publicações por docente no quadriênio. Se um Programa tem 10 docentes permanentes, os artigos em anais só têm valor até a 120ª publicação no quadriênio. As publicações B3, B4 e B5 não pontuam. As publicações de livros e capítulos são inseridas neste critério.
  
Após a saturação, a publicação em anais deixa de ser valorada.   Temos  a equação do VAPC4 que permite estimar o valor agregado por um tipo de publicação. Após a saturação, o termo referente a anais é excluído da equação. Da equação é possível construir a matriz.





A matriz é formada pelos coeficientes da equação e por seus inversos. 


      MVRP do Critério 4 – Produção Intelectual

Obs: Matriz apresentada refere-se a antes da saturação dos anais. Após a saturação, a linha e a coluna Anais não devem ser consideradas. A publicação em anais passa a não agregar qualquer valor e junta-se aos estratos B4, B5 e C.

No Critério 4, há uma queda substancial no valor relativo  dos anais comparativamente ao Critério 3. Oito artigos em anais valem um artigo A1. No Critério 3 eram 2,33.Um artigo em anais equivale a um livro. Os capítulos de livros são relativamente de pouco valor. Após a saturação, os anais não são contabilizados.


MVRP da avaliação Global.


A matriz exata da avaliação global, a rigor, só pode ser calculada após a avaliação final quando os limites de classes (Muito, Bom, Regular, etc.) são calculados. Todavia, como os critérios têm suas ponderações para a avaliação global, é possível construir um indicador com os pesos estabelecidos no documento de área.  A matriz deve ser vista como indicador a priori

Ressalte-se também que o valor relativo de publicações que não entraram nos dois critérios depende dos denominadores DR e Teses + 0,4 Dissertações. Para a matriz apresentada utilizamos DP = 16, Teses + 0,4 Dissertações =  51,2.

Para a avaliação global, não se criou uma equação. Os denominadores dos critérios 3 e 4 são diferentes, e a equação única ficaria muito longa. Assim, desenvolvemos uma planilha Excel para avaliar a matriz. Construímos duas matrizes: uma antes da saturação dos anais no Critério 4, outra após a saturação.

MVRP da avaliação Global, antes da saturação dos anais no critério C4.


MVRP da avaliação Global, depois da saturação dos anais no critério C4.


Observe-se que, em ambos os casos, a publicação em anais é bem mais valorizada do que uma publicação B3. Explica-se, embora os anais tenham saturação no Critério 4, como o B3 não é contabilizado no Critério 3, o que é equivalente a saturação em zero publicações. Logicamente, bem mais restritiva do que em saturação em 12 artigos por docente no quadriênio. 

Reflexões finais


A pós-graduação brasileira, em termos de produção científica, teve grandes avanços nas últimas décadas. A avaliação CAPES certamente contribuiu para essa melhoria. Para a avaliação, para nortear os programas, em sugerir veículos de publicações para docentes e discentes, consideramos que alguns atributos são de grande importância: a transparência, a estabilidade e a impessoalidade. A transparência é obtida por meio das publicações dos documentos de área. A estabilidade vem da robustez de critérios, por exemplo, dos critérios Qualis e de indicadores objetivos da avaliação. A impessoalidade vem da adoção, ao máximo possível, de critérios da comunidade externa, como, por exemplo, os fatores de impacto JCR, SJR e também o índice h5 do Google Acadêmico (Os dois últimos cobrem uma gama bem maior de periódicos). Quanto mais ancorados em indicadores da comunidade científica, mais impessoal e robusto serão os critérios de avaliação. Nesses casos, mais orientados estarão os programas para fins de evolução e de planejamento.

Agora, vou colocar minha análise. Trata-se de uma posição pessoal. Pelas avaliações anteriores, eu tinha a sensação que os artigos em periódicos, em todos os estratos, seriam mais valorizados do que artigos em congressos.Porém, isto não acontece na avaliação 2017. Um artigo B3 vale bem menos do que um artigo em anais. Para fins de indicadores dos programas acadêmicos, uma publicação B4 ou B5 é vista como publicação não científica. Equivalente ao estrato C.  Observe-se que os artigos B4 e B5 somente são contabilizados e referenciados nos critérios do mestrado profissional.

As MVRPs apresentadas proporcionam outras análises. Não vou fazê-las agora. Acima de tudo, considero que a MVRP, como metodologia, é instrumento para os programas de pós-graduação e formuladores terem uma visão de síntese da valoração das publicações.  da visão do todo. Ver o todo, é um grande desafio.

Finalmente, devemos entender que o Qualis é um instrumento de avaliação formulado a posteriori.   Assim, somente, no final de 2016 (último ano do quadriênio), sabemos a classificação do artigo publicado. Isso dificulta o planejamento dos programas. A estabilidade possível vem dos fatores de impacto. Estes não sofrem mudanças bruscas. Então, quanto mais periódicos avaliados com fatores de impacto, mais estável o sistema. Nesse aspecto, o SJR leva grande vantagem sobre o JCR. 

Fora disso, infelizmente. é possível submetermos um artigo em um periódico B2, e no momento da avaliação, o artigo ser classificado como B4, que no caso dos atuais critérios significa, valer tanto quanto um artigo não científico, isto é, valer nada. Porém, o problema da estabilidade de critérios somente será resolvido com o tempo, com o aumento  da base de periódico com fatores de impacto, e, ainda, case a estabilidade seja considerada relevante pelos formuladores dos critérios. 

Documentos consultados:



http://www.capes.gov.br/images/Artigo_dez_coisas_sobre_o_qualis.pdf

quarta-feira, 9 de outubro de 2013


DEMOCRACIA, PARTIDOS E PATOTAS

O estudo das formas de governo e a formulação de um modelo ideal tem sido um desafio para filósofos e cientistas políticos. Aristóteles, sucedendo a Platão, estabeleceu, há mais de dois milênios, uma tipologia que se tornou clássica. Utilizando o critério de quantidade, ele definiu: Monarquia como governo de um só; aristocracia como governo de um pequeno grupo; e politéia como a forma ideal, onde o governo seria formado pela aristocracia, no sentido de favorecer os mais capazes e pela democracia, no sentido de permitir que qualquer pessoa pudesse concorrer a cargo público.
Essas formas de governo podem ser boas quando visam interesses da maioria, ou corrompidas quando visam interesses particulares. Nessa linha elas degeneram em tirania, oligarquia e democracia, na época entendida como a maioria pobre governando em detrimento da minoria rica e da aristocracia.
         Após Aristóteles novos conceitos surgiram. A teoria do Estado foi objeto de estudo de muitos filósofos. A democracia passou a ser entendida como governo do povo e aceita como a forma ideal de Governo. A democracia pode ser a direta ou a representativa. Na forma ideal da democracia representativa os políticos organizam-se em partidos que têm ideologias ou idéias comuns explicitadas em programas partidários. O povo os elege para executarem programas apresentados em campanha e compatíveis com a ideologia partidária. Esse é nosso modelo teórico.
Porém, como seria a forma corrompida da democracia representativa? Quais os caminhos que levam a ela?
As distorções começam no momento em que os partidos não se identificam com seus ideais ou seus programas. Os políticos juntam-se em torno de interesses particulares e, quando não se sentem atendidos, mudam de partido como quem muda de patota. Buscam ser atendidos por outro grupo mais ligado ao poder. Ora, qual o melhor mecanismo do Poder para atrair novo partidários? A distribuição dos cargos públicos entre os parceiros de campanha e entre os que se dispuserem a ser cooptados. Essa forma corrompida da democracia representativa, movida a fisiologismo, poderia ser chamada de patotacracia. Nela, substituem-se os burocratas concursados por pessoas dos grupos políticos contemplados (os patotocratas).
Como evitar que essa situação ocorra ou sair da mesma caso tenha ocorrido? Esses são desafios para a cidadania e a sociedade. Porém, como ter cidadania em um contexto de lideranças políticas de patotas? Somente o senso crítico, a educação e a prática política com cobrança e ética podem evitar.
Olhemos ao nosso redor e façamos uma reflexão: Será que estamos, ou corremos o risco de cair nessa armadilha? Se assim for, é bom termos cuidados e mudarmos de atitude no processo democrático, pois a patotacracia, tal como o Leviatã de Hobbes, é um modelo perverso.  
Cobremos dos políticos que elegemos uma postura ética, compatível com uma boa democracia representativa e, principalmente, que cargos públicos não sejam objeto de barganhas políticas. É indispensável cobrar uma reforma política que não se limite a aumentar as verbas públicas para as campanhas e tenha como objetivo a busca de uma forma de democracia realmente representativa. A fidelidade dos eleitos aos partidos e dos partidos aos seus programas está no centro desse modelo.

Text publicado em 2008 na Tribuna da Imprensa -RJ. Ainda está atual